O Bem e o Mal em guerras reais

São muitas as táticas de defesa de um território, seja de uma nação, estado, cidade e até de sua própria casa. Quando se trata de defender uma região sem fronteiras definidas ou sob invasão, a forma mais barata e de menor emprego humano e minar um campo, técnica utilizada por todos os paises que já entraram em conflito armado, atrás das linhas minadas a segurança está preservada. Por ali ninguém passa ileso de causar uma estrondosa explosão, ninguém passa em silencio. E por esta guerra vale tudo.

Acordos territoriais são assinados e vem o fim da luta armada, comemoram-se dos dois lados, cada um suprimindo a sua dor, cada um com uma visão de uma suposta vitória, se é que esta houve. Tudo está resolvido quase resolvido. Não se ouvem mais os zumbidos dos canhões, o que ficou para tráz a natureza se encarrega de ir apagando com o tempo.




Faltam às minas que não explodiram... elas continuam em silencio, escondidas por guerrilheiros peritos e já movimentadas pela acomodação das terras após as chuvas. Ninguém mais sabe ao certo onde elas estão, só descobrem um campo minado quando explode uma das minas.


A guerra agora é interna e de sobrevivência, descobrir os campos e desminar, com técnicas nem sempre precisas, com um cem numero de acidentes, ceifando as vidas de civis.


Na África este mal assola diversas regiões, muitos se especializam em desativar minas, mas muitos ainda se especializam em viver sem as pernas, quando sobrevivem.


Esta é uma realidade exposta a todos e muitos são os expostos a estas minas, a Àfrica não quer mais o horror a guerra, que separa nações, povos, familias e que principalmente matam os sonhos de tantos que começaram a viver agora e que querem viver muito ainda.



Casamento Mulembe

Fui convidado, por educação, a ir a um casamento de um familiar de um par que trabalha comigo aqui em Luanda, convidado de ultima hora, mas convidado e como assim entendido não pensei muito e sapequei um “Mas é claro...adoraria...”, percebi que a surpresa foi mais do anfitrião de que minha.

Domingo de tarde já havia combinado com o motorista e aparatos, estavam ali a espera na porta do hotel Presidente, no caminho pensei no que eu poderia encontrar para sorver desta tão bela cultura, imaginei centenas de vezes as danças, as comidas típicas e o próprio enlace matrimonial como se daria, pena que não deu tempo, logo chegamos.

O Anfitrião me recebeu a porta, após as instruções básicas dos anjos de guarda, adentrei a festa... e que festa! Para mais de cem pessoas, sorridentes, felizes com o evento, conversando ao mesmo tempo em que gingavam com a musica, para todos os lados só se ouvia “ta fiche!!!” e de fato estava muito fiche a festa.

Fui apresentado a Dna. Imbaziliê, ô negra cheirosa de alfazema, depois dos cumprimentos, abás e axelies, assentei-me ao lado dela toda feliz ali assistindo aos seus descendentes felizes.

O meu desconhecimento não me alertou de que eu estava ao lado da matriarca daquela tão bela família e fui ficando, envolvido ali naquela conversa com ela, todos os demais convidados que chegavam a cumprimentavam primeiro e, por condicional, eu estando ao lado dela era o próximo. A moda os pingüins do filme Madagascar... sorria e acene...Principalmente quando os convidados falavam em dialeto, não posso dizer que meu curso de Umbundo (um dos 12 dialetos do pais) está a 100%, oras, mal chega a 10.

Não se faz um prato de comida, a própria comida lhe vem às mãos literalmente, trazida por miúdas sorridentes que te servem a mão, com a outra oferecendo o Jindungo (pimenta). Comi de tudo um pouco e muito do que ali parava a minha frente.

Eu e Dna. Imbaziliê conversávamos sobre as diferentes culturas, onde termina um e começa o outro já na porta de quem o iniciou e na janela de uma fronteira separada pelo atlântico. Me lembrava as conversas que eu tinha com Cidra.

Não sei precisar exatamente em que momento formou-se uma roda a nossa frente, dançava em roda mais de 30 pessoas, que riam e executavam uma coreografia desenhada de forma complexa, entrelaçados ao mesmo tempo que separavam homens e mulheres em círculos diferentes, as vezes a sós as vezes ao pares.

Em dado momento a roda se abriu frente a Dna. Imbaziliê, uma salva de palmas a ela e gritos altos de “Malembo Malembo”. Veio de pronto o noivo, vestido de vermelho e a ajudou a levantar para que ela pudesse dançar com ele. Para minha surpresa toda a dificuldade que ela teve para levantar-se desapareceu quando ela pôde se sustentar no contraponto de sua bengala e suas frágeis pernas.

E todos aplaudiram aquela pequena menina de 87 anos dançando um Mulê com capricho. Já tenho autorização para em uma próxima festa fazer algumas fotos, estes momentos ficarão só na minha mente.

Dna. Imbaziliê rodou por toda a volta da fogueira em baixo de uma chuva de aplausos, literalmente a lua parou para assistir aquele espetáculo e deve estar sorrindo do sol que nada viu, mas de certo ouviu a história e irá querer a confissão.

Parou e me observou ali sentado, sorrindo para ela. Acenou com a mão me chamando e eu naquele momento queria que a cadeira me escondesse, os convidados a volta dela entoaram de baixo a alta voz “Eta Daim” (vai o branco), não teve como ser diferente, levantei-me e na direção dela caminhei na intenção de receber ali uma orientação de como seria a dança, principalmente dizer que eu não conhecia os modos, antes de eu chegar ela já partiu rodopiando menina novamente em volta da fogueira.

O som dos retimbundos, tambuques e chocalhos tocando me levaram a recordações de muitos e muitos anos, me envolvi no som e comecei a dançar como eu fazia, via em minha memória a imagem de Tibira a minha frente, dançando sobre o chão que insistia em tocar os seus pés sem o conseguir.

Me embebedei daqueles sons e lembranças e dancei. Lembrei de minha eterna companheira dizendo que qualquer dança para mim terminava daquele jeito, gingado, pernas semi curvadas, cotovelos quase na altura dos peitos, girando e gingando. Queria eu que ela naquele momento estivesse dividindo aquilo tudo comigo.

Só quem assistiu sabe dizer o tempo que ali ficamos dançando, quando ouvi o repique do tambuque girei e parei junto a ela que já demonstrando as dificuldades que passa o seu corpo enquanto a sua mente exige mais, me abraçou e depois segurou em minhas mãos e disse em voz alta...”você dança como um africano e é tão negro quanto sua mente o deixa ser... e eu quero ser tão branca como a alegria que sinto agora”. Estava ali quebrada a barreira mor dos dois povos.

Os aplausos ao dito não cessavam, minha mente pensava em algo para dizer, ao mesmo tempo que rezava que fossem eternos...não tive mais tempo, ao fim dos aplausos a ela eu disse que me alegrava em estar ali e viver este momento único, novas palmas e retornamos as nossas cadeiras.

Passado aquele momento de integração, muitos vieram me perguntar de onde eu era e se no Brasil se dança assim, de uma forma ou de outra, pelo menos aquele grupo, hoje fazem uma imagem diferente dos brasileiros.

Como nenhuma festa pode passar da meia noite, exceto se esta começar depois de meia noite, o que não foi o caso, às 22 horas eu estava de volta ao hotel, sorrindo sozinho, com uma energia tão boa que será eterna.

È assim que aos poucos vou conhecendo esta cultura riquíssima, rodeada de histórias e de mistérios.

Até a proxima!